"Ponto de vista": O Parlamento Europeu e as eleições de Maio.


Com o previsível aumento da abstenção nas próximas eleições para o Parlamento Europeu, e com o provável aumento da representação dos chamados euro-cépticos - que poderão incluir mesmo deputados declaradamente anti-União Europeia - há que reflectir profundamente sobre a identidade europeia, o espírito europeu, e a reformulação dos Tratados, em processo que só poderá ter resultados consistentes se for objecto de profunda participação dos cidadãos.

Por enquanto assiste-se, é certo, a uma cascata de iniciativas que procuram promover soluções de natureza institucional que não procuram contudo tocar na arquitectura política da União, sendo talvez a mais relevante a nível inter-Estados Membros a que reune 17 Fundações, entre as quais a Gulbenkian, havendo também que mencionar a que a "Notre Europe" promoveu sob a direcção de António Vitorino, e a iniciativa da Comissão Europeia "Debate sobre o futuro da Europa"

A primeira propõe "Um novo pacto para a Europa" ( http://www.newpactforeurope.eu/documents/ ) que mesmo na mais ousada das opções - o regresso às origens com a correcção de erros notoriamente cometidos - não toca muito na organização da União.

A "Notre Europe" - Fundação que embora sob a égide de Jacques Delors foi aparentemente esquecida pelas 17 já mencionadas limitou-se a apresentar um documento intitulado "Eleições europeias: avante a toda a força!", que termina instando os europeus a votar.

A iniciativa da Comissão Europeia teve pouca repercussão na opinião pública, atingindo - tanto quanto sei - apenas uma muito reduzida percentagem de eleitores.

Outras iniciativas terão por certo ocorrido, mas o facto de não terem obtido impacto suficiente para serem referidas adequadamente nos meios de informação pública retira-lhes a capacidade de influência que poderiam ter no caso de as respectivas propostas se apresentarem com fundamentação interessante.

De tudo isto resulta que os eleitores, perplexos com o fraco desempenho das Instituições durante a crise financeira e institucional que se abateu sobre a União Europeia, e muitos duvidando das vantagens de uma moeda comum, hesitarão antes de decidirem ir votar para uma eleição de um Parlamento cujos poderes sentem como extremamente limitados - nomeadamente no que respeita às respectivas relações de poder com o Conselho Europeu e em particular com a condução das políticas de natureza financeira, nelas incluindo o papel do Euro.

Sentirão, e em particular após as eleições, um enorme vazio que os levará a interrogarem-se sobre se os seus representantes - em especial os deputados, mas também os governantes - estarão à altura de tomarem as decisões que se apresentem como necessárias para revitalizar a União.

Verificarão que o grande distanciamento entre os deputados e os eleitores não é de molde a assegurar que o actual sistema representativo cumpra o seu papel de controle democrático dos poderes de natureza executiva, chegando à óbvia conclusão de que é necessária uma profunda revisão do sistema de organização política em que a participação de base - aliada a mecanismos de representação indirecta através de eleições de câmaras legislativas intermédias - possibilite o aperfeiçoamento do exercício do poder democrático, e a correcção dos erros de concepção que estiveram na origem do actual declínio da União Europeia.

E, nessa base, constatarão que talvez um primeiro passo pudesse residir em que fossem os parlamentos nacionais a eleger os deputados europeus.

9.Fevereiro.2014.