"Ponto de vista": UE: 60 anos, desafios.


    UE: 60 anos, desafios.

A comemoração do 60.º aniversário do Tratado de Roma, que estabeleceu as primeiras instituições (Comunidade Económica e Europeia, e Comunidade Europeia para a Energia Atómica) cuja evolução deu origem à presente União Europeia, foi marcada pelo simbolismo de ocorrer poucos dias antes da prevista comunicação do Reino Unido sobre a respectiva saída da União, e pelo indisfarçável apoio do Presidente dos Estados Unidos da América a tal facto - bem como pelo um pouco mais escondido apelo a mais saídas.

No mesmo local onde se situava o Tabularium, Arquivo oficial do império romano, sobre cujas ruínas viriam a ser erigidos os Palácios capitolinos, os mais qualificados representantes dos 27 Estados-membros que continuarão a constituir a União Europeia ouviram o Presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, pronunciar finalmente um discurso cujo conteúdo o caracterizou como um verdadeiro dirigente europeu.

E ouviram o Presidente da Comissão Europeia, ocupando igualmente um espaço político que estava vazio desde que D.Barroso, R.Prodi e J.Santer tinham sucedido a J.Delors. exprimir um sério aviso aos EUA no sentido de dever cessar com tais apelos a saídas de Estados-membros, que no caso do Balcãs aumentariam as tensões e riscos de confrontações militares naquela zona.

Há muito que tenho vindo a referir que de acordo com as modernas teorias de análise de auto-organizações estas mudam com maior probabilidade o seu ritmo evolutivo quando surgem agentes catalisadores - externos ou internos - sem os quais a respectiva organização interna continua a desenvolver-se ao mesmo passo, tendendo a manter alguma inércia inibidora de aperfeiçoamentos mais rápidos nos seus processos de adaptação a eventuais desafios exteriores.

E tais catalisadores tanto podem actuar num sentido de melhoria da organização, passando a um estado de maior consistência e funcionamento, como no de uma desagregação, sendo essencial detectar-se quanto antes qual o sentido provável da respectiva acção.

As reacções expressas por D.Tusk e J.C.Juncker indiciam assim que tanto a "Brexit" como o inusitado apoio a esta por parte de D.Trump podem ter um efeito positivo sobre a coesão da União Europeia, diminuindo as consequências centrífugas que outro catalisador - a grande imigração ocorrida nos anos mais recentes - ameaçava ter sobre diversos Estados-membros.

Efeito positivo que poderá ter ocorrido nas eleições recentes nos Países Baixos, em que G.Wilders não obteve os resultados que muitas sondagens lhe auguravam.

É porém lamentável que só agora é que se verifique a proliferação de manifestos de "intelectuais", "pensadores", e "personalidades" apelando a uma refundação da União Europeia, quando antes, instalados confortavelmente nas suas poltronas e cátedras, esqueciam dois princípios básicos que deviam estar presentes nas suas reflexões: as pessoas, primeiro - e o diálogo entre elas; e a necessidade da reconstrução do Espírito Europeu que, originado na sequência das convulsões da primeira metade do século passado, não tinha nem tem estado suficientemente presente no reencontro da Europa com o mundo.

A tal tenho vindo a apelar desde há alguns anos nestas páginas, e junto de diversas "personalidades" - sem grande sucesso. porém.

É que considerar em primeiro lugar as pessoas, as ideias, e os princípios, é o que deve nortear a acção política - e não a subordinação destas ao comércio, às finanças, e à moeda.

26.Março.2017