"Ponto de vista": Referendos, sondagens, e democracia.

 
    Referendos, sondagens, e democracia.

A democracia representativa é reconhecidamente a melhor forma de organização do poder político, na medida em que permite - em teoria - uma distribuição o mais equitativa possível das possibilidades de livre escolha das pessoas que irão governar a nossa vida colectiva, escolha essa que até poderá recair sobre nós mesmos.

E torna-se ainda melhor sempre que permite graus cada vez mais elevados de participação na vida política, nomeadamente quando exercidos ao nível do poder local, o que permite aos cidadãos um conhecimento mais profundo das pessoas que foram eleitas para os representar, e ao mesmo tempo possibilitando através das suas intervenções que o poder político seja exercido de um modo mais correcto e eficaz.

Estas perspectivas entram de certo modo em conflito com o uso de referendos para legitimar opções que os detentores do poder político não ousam tomar, e que se em certos casos se apresentam como legítimas e dentro de um quadro de decisões dicotómicas, já noutros o conjunto de factores a considerar, ou a sua complexidade, aconselham a que não se recorra a tal método.

Seria o caso da "Brexit", em que tudo indica que não haverá ganhadores: nem o Reino Unido, nem a União Europeia.

Nesta época em que as sondagens já permitem determinar elevadas probabilidades de ocorrência de situações de empate, a decisão de promover um referendo sobre um assunto tão delicado e complexo, aparentemente determinada por razões de política interna, agora claramente demonstrada pelo comportamento oscilante de D.Cameron, apresenta-se como um erro grave cujas consequências para a Europa se poderão situar em termos análogos ao do afundamento iniciado no princípio do século XX, e que o movimento europeu dos anos 50 tinha permitido suster.

Recorde-se que não houve recurso a referendos quando foram criadas as primeiras Instituições de união europeia, nem a propósito da adopção do Euro ou da livre circulação no espaço Schengen; mas quem nåo se recorda de um referendo nacional em que a principal figura era o "canalizador polaco' que viria destruir milhares de postos de trabalho?

Numa democracia saudável em que os eleitores se sentem perto de quem os representa nåo há que temer as decisões dos eleitos.

E muito menos recorrer a subterfúgios constitucionais para contornar a falta de coragem para as tomar.

19.Junho.2016.