"Ponto de vista": Conacri - há 45 anos.


    Conacri - há 45 anos.

Completam-se hoje 45 anos sobre a Operação "Mar Verde", cujos objectivos principais eram a destituição do Governo da República da Guiné (Conacri) e a tomada do poder por elementos da oposição ao Presidente Sekou Touré que se comprometiam a retirar o apoio ao Partido Africano para a Independência da Guiné e de Cabo Verde, estando também previstas a neutralização das estruturas daquele Partido, e a libertação dos prisioneiros portugueses em seu poder.

Para o efeito, o Presidente do Conselho de Ministros, Prof.Marcelo Caetano, autorizou que uma força naval transportasse Unidades do Exército (Comandos) e da Marinha (Fuzileiros), bem como elementos do Front National pour la Libération de la Guinée (FNLG), que desembarcariam com vista à concretização daqueles objectivos.

A única condição foi a de que não fossem deixados "vestígios", nada tendo sido referido quanto aos procedimentos a seguir em caso de insucesso que porventura levasse ao aprisionamento de pessoal militar português.

Para o efeito, as unidades navais não arvoraram a bandeira nacional, tendo sido ocultadas as identificações dos respectivos cascos, e todo o pessoal que desembarcou usava uniformes especiais que não os das Forças Armadas portuguesas, não transportando objectos (até cigarros) susceptíveis de serem identificados como habitualmente usados em Portugal ou na própria Guiné (Bissau).

São conhecidos os contornos da operação, para cuja concretização era essencial que fossem destruídos os aviões de combate da República da Guiné, que se admitia pudessem estar operativos e atacar a força naval, o que poderia levar ao afundamento ou à imobilização de todos ou alguns dos navios.

Soube-se depois que os aviões tinham sido transferidos anteriormente para outro aeródromo no interior do país, pelo que quando o grupo de combate encarregado da destruição respectiva chegou ao aeroporto nada encontrou, o que levou à decisão de abortar as acções ainda em curso e de retirar.

Porém, era já dia claro quando os 6 navios iniciaram o regresso, e mantinha-se a possibilidade de um ataque aéreo que por certo teria há 45 anos mais probabilidade de ter então mais eficácia do que se tentado de noite.

Iniciado o regresso, o NRP "Montante" recebe porém a ordem de inverter o rumo e ir recolher uma dezena de elementos da Companhia de Comandos que tinham desembarcado, e que se tinham atrasado por razões não totalmente esclarecidas, deslocando-se agora de bote a motor. Não eram acompanhados por quaisquer outros elementos, nomeadamente do FNLG.

Eram quase 9 horas da manhã.

De terra, são disparados alguns tiros de armas pesadas, visando o navio, que se encontrava a cerca de mil jardas (900 metros) de terra, que ripostou visando o local provável dos disparos, que de pronto cessaram.

E no espírito de alguns dos membros da Guarnição perpassou o seguinte pensamento: se os aviões de combate surgem, disparam sobre o navio, e apesar da nossa resposta conseguem atingi-lo e provocar o seu afundamento ou o encalhe (pois navegava-se em zona de baixos fundos), e se a recolha de sobreviventes através de botes de outros navios se tornar impossível nomeadamente no caso de terem também sido atingidos ?

Ou se volta a haver disparos de terra, com maior sucesso do que os até então tentados, levando igualmente à imobilização do navio ?

Nadar para terra seria uma reacção provável para alguns, dos quais os que não fossem mortos poderiam ser aprisionados.

Sem instruções precisas, alguns - de entre o pessoal da Guarnição, ainda usando o seu uniforme de Marinha - tentariam identificar-se ao abrigo da Convenção de Genebra. Seriam reconhecidos como prisioneiros de guerra ?

Tais ataques aéreos não ocorreram, nem houve mais disparos susceptíveis de imobilizarem o navio - mas poderiam ter ocorrido

Porém, pouco tempo depois, um avião militar sobrevoa Conacri e a força naval - se bem que a grande altitude,

E daí a algumas horas já Rui Patrício, Ministro dos Negócios Estrangeiro, negava na radio qualquer envolvimento português em Conacri.

À guisa de conclusão: como habitualmente, nestes casos os mais altos responsáveis - na circunstância o Presidente do Conselho de Ministros - limitam-se a deixar "vestígios" de orientações claras, ou "vestígios" de responsabilidades - quando não são eivadas de insensatez como a proferida em Dezembro de 1961: "Não prevejo possibilidade de tréguas nem prisioneiros portugueses, como não haverá navios rendidos, pois sinto que apenas pode haver soldados e marinheiros vitoriosos ou mortos.".

22.Novembro.2015.

-------------------------------------------------------------------------------------