"Ponto de vista": O momento político e a base da democracia.


O momento político e a base da democracia.

Na semana que findou realizaram-se algumas comemorações do segundo aniversário da tomada de posse dos órgãos de poder local em freguesias de um concelho de matriz urbana de grande dimensão, freguesias essas que tinham resultado da agregação de anteriores na sequência da RATA - Reorganização Administrativa do Território Autárquico, Lei imposta pelo Programa de Assistência Financeira aceite pela República Portuguesa em 2011 - parece que a única "reforma estrutural" da Administração Pública até agora realizada...

Tal Lei levou a que Freguesias já de si enormes, com mais de 20 mil eleitores, fossem objecto de fusão constituindo novas estruturas autárquicas, denominadas "Uniões", que passaram a ter mais de 50 mil cidadãos.

Não foi assim por acaso que tanto o Presidente da Junta de uma das novas Uniões de Freguesias como o Presidente da Câmara Municipal tivessem nos seus discursos lamentado a "reorganização" que tinha conduzido à constituição de autarquias totalmente afastadas do conceito de proximidade que deveria ser sua característica.

Acresce que ambos não provinham de forças políticas conotadas com a oposição ao Governo, o que não os impediu de considerarem muito insuficientes e mesmo inexequíveis as disposições legislativas que visam a atribuição às novas Uniões de Freguesia de recursos que tinham como objectivo contribuir para a execução das suas competências face à extensão dos seus territórios e população.

Num dos casos (e por certo também nos similares) foi focado o facto de as "economias" obtidas com a reorganização terem sido extremamente reduzidas, pois limitaram-se a passar de 4 Presidentes de Junta remunerados a tempo inteiro para apenas 1 - ou seja uma redução mensal de encargos de cerca de 9 para 2 mil euros, pois a extensão geográfica obrigou à continuação de praticamente o mesmo número de funcionários nas 3 agora delegações que não podiam deixar de existir.

Será pois possível considerar positiva tal "reorganização", que leva a que apesar dos esforços de uma Junta em realizar rotativamente as suas reuniões públicas mensais nas anteriores sedes de Juntas não consegue que estejam presentes em média não mais do que 4 cidadãos - num universo de mais de 50 mil ?

E que nas reuniões trimestrais das Assembleias de Freguesia apenas assistam habitualmente cerca de 8 a 10 ?

Não só a extensão territorial, mas também a notória falta de atribuições, competências, e recursos contribuem para o afastamento dos cidadãos da vida política, tal se reflectindo na qualidade de vários dos representantes eleitos para os órgãos autárquicos e nos seus reflexos nas estruturas partidárias, que assim tendem em muitos casos a serem meras correias de transmissão dos dirigentes centrais e distritais, em vez de serem confrontadas com a presença e observação críticas dos cidadãos eleitores.

Dirão alguns: a nossa democracia é representativa - ao que naturalmente concordando acrescento que deve também ser participativa.

E embora meritória a participação nas "redes sociais" e em comentários expressos electronicamente não se pode substituir totalmente ao diálogo pessoal - porventura alguém já conseguiu "almoçar electronicamente" com um amigo?

O momento político que atravessamos cada vez mais reforça a necessidade de se proceder à "expulsão" e revisão deste inútil e prejudicial ditame do Programa que foi associado ao uso da palavra "troica".

Sem uma participação empenhada dos cidadãos o nosso País continuará a definhar. E este é um dos meios que temos para voltar a dar ânimo aos portugueses, muitos deles já descrentes da democracia e de muito dos seus actores.

25.Outubro.2015.